Recém- licenciados já devem 1,4 milhões de euros aos bancos

Recém- licenciados já devem 1,4 milhões de euros aos bancos Para alguns é a única forma de financiarem o curso.

Financiamentos totais ascendem aos 180 milhões de euros.

“Há pessoas que dizem que a universidade não é para todos. Eu meti na cabeça que era.” Por isso, para ir estudar para Lisboa, a madeirense Andreia Jesus pediu um empréstimo ao banco. Vinte e cinco mil euros que terá de começar a pagar quando acabar o curso. Consciente de que Antropologia não é uma área fácil para arranjar emprego, confessa- se “assustada”. Ainda mais porque tem o exemplo da prima, que continua desempregada, dois anos depois de terminar a licenciatura, e que teve de pedir ajuda à mãe para não falhar as prestações. Mas há jovens – e famílias – que já não conseguem pagar. Serão perto de duas centenas e devem 1,4 milhões de euros à banca.

 
Os dados são da Sociedade Portuguesa de Garantia Mútua ( SPGM), que gere o sistema que permite aos estudantes pedirem empréstimos aos bancos tendo o Estado como fiador – e com uma taxa de juro reduzida. Desde que esta linha foi lançada, no ano letivo 2007/ 2008, já houve quase 16 mil alunos a pedir crédito, recebendo um total que ronda os 180 milhões.

Como este sistema requer que os estudantes comecem a pagar 12 meses após acabarem o curso, as dificuldades notam- se sobretudo nos “pioneiros”, os que fizeram empréstimos no primeiro ano: a taxa de incumprimento era de 2,2% em novembro e subiu para 2,4% em dezembro. Entre os que pediram crédito no ano letivo 2008/ 09, passou o 1% no final do ano. “Só agora é que os primeiros acabaram os cursos e estão a começar a amortizar as dívidas. O incumprimento não é dramático, mas está a crescer muito”, diz o presidente da SPGM, José Fernando Figueiredo.
Com um em cada três jovens com menos de 25 anos no desemprego, nem os licenciados escapam à crise – há mais de 40 mil inscritos nos centros de emprego. Assim, a lógica deste sistema fica ameaçada, já que muitos estudantes não conseguem entrar no mercado de trabalho logo após concluírem o curso. Nestes casos, ou pedem dinheiro aos pais ou pedem a reestruturação da dívida. “Ainda ontem tratámos da reestruturação da dívida de um estudante. Não sendo um drama, é um problema que vamos ter de acompanhar”, reconhece o responsável. Na pior das hipóteses, os incumpridores vão parar à lista de devedores do Banco de Portugal.

Os empréstimos têm um teto de 25 mil euros, mas os alunos pedem em média 11 600. Segundo um inquérito realizado pelo ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa, a pedido da SPGM, o dinheiro serve para cobrir um conjunto de despesas básicas: principalmente as propinas, mas também transportes, alimentação, alojamentos, compra de computadores. Quase metade dos alunos que pediram dinheiro estavam deslocados de casa. Cerca de um terço, além do empréstimo com garantia mútua, conta também com o apoio dos serviços da ação social.

É o caso de Andreia. Mas os 300 euros de bolsa estão longe de chegar para se manter na capital ( ver texto ao lado). Daí muitas associações de estudantes terem criticado este sistema, por considerarem que está a substituir a ação social. Outros reconhecem a sua importância. “Estes empréstimos são muito importantes para alguns estudantes, sobretudo porque estamos a assistir a um corte nas bolsas”, diz Filipe Pacheco, presidente da Associação dos Estudantes do Instituto Superior Técnico. Aliás, este ano, quase dez mil perderam a bolsa. Sucedem- se também relatos de dificuldades e até de fome entre os universitários. “Não sendo a solução mais fantástica, não tenho dúvidas de que é um instrumento muitíssimo importante”, considera José Fernando Figueiredo

 
Para Ricardo Ferreira, que fez um empréstimo há três anos, a solução era optar por um modelo mais parecido com o de outros países, onde os estudantes só precisam de começar a pagar depois de terem emprego.