Presidente da República preocupado com a coesão social

Numa mensagem de Ano Novo que não encheu três páginas e meia, Cavaco Silva reservou três parágrafos e algumas linhas para alertar o Governo para o diálogo com os parceiros sociais. O aviso surge depois de os sindicatos terem batido com a porta da concertação social e no primeiro dia de um ano que começa com a reforma das regras dos despedimentos na agenda e que se prevê de agravada contestação nas ruas.
Em jeito de alerta, o Presidente pinta um cenário negro da situação: “Sem uma agenda para o crescimento económico e o emprego”, avisa, “a situação social poderá tornar- se insustentável e não será possível recuperar a confiança e credibilidade externa do País”.
Em seis meses em São Bento, Passos viu uma greve geral e contou dezenas de protestos sectoriais. Mas isso poderá ser uma amostra da pressão sobre a coesão social. O Governo tem de avançar com reformas estruturais na área do trabalho, da administração pública e do poder local em 2012. E a concertação social, que podia servir de almofada para a contestação, parece perdida. A CGTP saiu das negociações e a UGT avisou que não aceitará acordo algum se o Governo insistir em aumentar em meia hora o horário de trabalho.
Depois de ter pressionado à negociação do Orçamento e à redução dos cortes dos subsídios, o Presidente faz do consenso e coesão sociais a prioridade e guarda margem para fazer pontes com a oposição. “A coesão social é da maior importância […]. Daí a insistência com que tenho sublinhado a importância da repartição equitativa dos sacrifícios exigidos aos portugueses, do combate às desigualdades, do apoio A troika quer ver as políticas em marcha quando vier para a terceira avaliação em fevereiro, e o memorando tem prazo claramente definidos. A reforma do Sector Empresarial do Estado é uma das que está na calha. No plano laboral vão ser alteradas as regras de despedimento e reduzidas as indemnizações e as prestações do subsídio de desemprego. A reforma da administração local com a redução do número de autarquias tem de estar feita
no verão aos mais carenciados e desprotegidos do diálogo constitutivo entre o Governo e a oposição e do aprofundamento da concertação social.”
“Um diálogo frutuoso com os parceiros sociais, sobre as medidas dirigidas à melhoria da competitividade das empresas, será certamente um contributo positivo para reduzir a conflitualidade e as tensões e criar um clima social mais favorável ao aumento da riqueza nacional, ao investimento e ao combate ao desemprego. De todos os participantes no processo espera- se abertura genuína ao compromisso, de modo a alcançarem os consensos de que o País tanto
precisa
Meia hora
Foi uma das contrapartidas negociadas com a
para substituir o corte na taxa social única. O Governo avançou com a proposta de lei para o Parlamento fora do pacote das alterações à lei laboral que estavam a ser discutidas com os
parceiros. para mitigar a dureza dos tempos quer correm.”
O Presidente começou a mensagem a avisar para a ilusão das facilidades e afirmou que em 2012 “se irão exigir grandes sacrifícios ao comum dos portugueses e que as dificuldades se farão sentir de forma mais acentuada no dia a dia das famílias”.
Cavaco pôs- se no lugar “onde um Presidente deve estar”: “Ao lado daqueles que necessitam de apoio.” Depois exigiu aos políticos que expliquem os fundamentos das políticas e repetiu que é preciso que os sacrifícios valham a pena. Mas não deixou margem para uma renegociação dos compromissos ou aligeirar do esforço. “Além de cumprir as obrigações internacionais que assumimos, temos todos de empenhar o melhor do nosso esforço [. . . ] para garantir um futuro em que os portugueses reconheçam que os sacrifícios valeram a pena. Este é o desafio crucial com que estamos confrontados”, afirmou, demarcando- se do PS de António José Seguro, que defende o alargamento dos prazos de redução do défice.
O Presidente co- responsabilizou a UE pela situação do País e exigiu uma estratégia europeia para o crescimento e o emprego. “A UE vive um tempo de grande incerteza que afeta negativamente a nossa economia.” Não devemos esperar que seja a Europa a resolver problemas cuja solução é da nossa responsabilidade. Mas a situação difícil em que Portugal deverá chegar a um défice de 4,5% este ano sem recurso a medidas extraordinárias. Isso obriga a uma redução de 3 pontos do défice estrutural. A troika pode aceitar défice acima para pagar dívidas com o dinheiro que sobrou do fundo de pensões da banca.
O novo ano trouxe consigo aumentos de impostos e de preços. Os mais notados são no IVA. O sector da restauração passou a pagar a taxa máxima do imposto sobre consumo: um aumento de 10 pontos percentuais. Muitos dos produtos básicos que até aqui pagavam 6% de IVA passaram para a taxa de 23%. A eletricidade e o gás subiram 4%. Os transportes vão aumentar em fevereiro. Funcionários públicos e pensionistas vão perder uma parte ou o total dos subsídios o País se encontra não nos deve impedir de ter uma voz ativa na defesa de uma resposta à crise da Zona Euro que inclua uma estratégia europeia de promoção do crescimento económico e do emprego, particularmente dos jovens.”
Os jovens desempregados foram o pretexto para uma das farpas que lançou contra Passos Coelho. Semanas depois da polémica entrevista em que o primeiro- ministro admitiu a emigração como solução para os professores desempregados, o Presidente disse conhecer “a ansiedade de milhares de jovens para quem tardam os caminhos com que sonharam, muitos dos quais procuram a sua sorte longe da família e do País, quando tanto precisamos deles”.
Também as comunidades emigrantes, que foram omitidas na mensagem de Natal do primeiro- ministro, e de onde se ouvem ameaças sobre o não envio de remessas por causa do fecho dos consulados, tiveram direito a “uma saudação muito especial”.