Pobreza limita capacidade de tomar decisões certas

O senso comum basta para se perceber que uma pessoa que vive em situação de pobreza não tem as mesmas armas para ultrapassar os problemas de quem não passa dificuldades. Mas investigadores da Universidade de Princeton, nos Estados Unidos, apontam, num estudo publicado na Science, uma explicação mais profunda para o círculo vicioso que muitas vezes eterniza a pobreza: o esforço acrescido para lidar com obrigações como pagar as contas e reduzir despesas traduz- se num desgaste mental tão grande que afeta a capacidade de tomar outras decisões que poderiam fazer a diferença.

Os investigadores, através de um conjunto de experiências com voluntários, encontraram mesmo uma medida exata para o impacte que estes constrangimentos têm nessa capacidade: “Em média, [ nos testes realizados] as pessoas com problemas de dinheiro exibiam uma descida nas capacidades cognitivas similar a uma perda de 13 pontos no quociente de inteligência ou à perda de toda uma noite de sono”, dizem. “Anteriores visões da pobreza culpavam falhas pessoais ou um ambiente que não conduz ao sucesso pela situação”, explica Jiaying Zhao, um dos autores. “Nós argumentamos que a falta de recursos financeiros pode, por si mesma, levar a uma limitação das funções cognitivas.”
Ao DN, Alfredo Bruto da Costa, especialista em pobreza e presidente da Comissão Nacional Justiça e Paz, não tem dificuldades em validar este ponto de vista: “Não conhecia nenhum estudo específico, mas isso é o que sabemos da nossa experiencia”, diz. “Uma carência nunca é simplesmente física. Uma carência física tem implicações psicológicas, ao nível do sistema nervoso. Vai afetar todo o comportamento e até gerar situações complexas.”
Segundo os autores do estudo, as limitações cognitivas ditadas pela pobreza afetam a capacidade de apostar em áreas como a educação, a formação profissional ou a gestão do próprio tempo – todas importantes para se conseguir uma evolução qualitativa na vida.
Bruto da Costa acrescenta outros exemplos, saídos da realidade portuguesa – onde se estima que 18% da população, 1,9 milhões de pessoas, seja pobre: “Quando as pessoas vivem em situação de pobreza, às vezes até desentendimentos familiares podem levar a situações extremas. Desentendimentos entre pais e filhos tornam- se muito mais graves.”
Para o sociólogo, a estratégia portuguesa para lidar com a pobreza “tem passado sempre por mitigar o seu impacte”, através de apoios sociais, “e quase nunca por ajudar as pessoas a saírem dela, promovendo aumentos dos salários e pensões baixos que mantêm as pessoas nessa situação”.