Pobreza afeta o cérebro infantil

Estímulos auditivos são processados mais devagar e stress é maior, o que pode causar dificuldades na escola

Crescer na pobreza tem repercussões no cérebro, nomeadamente na dimensão de uma estrutura chamada hipocampo, onde é processada, por exemplo, a memória, e também no sistema auditivo, e os efeitos podem ser duradouros. À semelhança do ambiente carenciado em que se desenvolvem as crianças dos meios desfavorecidos, a sua audição e desempenhos cognitivos também tendem a ser mais pobres. São conclusões de dois estudos agora publicados – um deles, hoje, no Journal of Neuroscience, e outro, ontem, no JAMA Pediatrics – em que os investigadores utilizaram imagens por ressonância magnética para chegar aos resultados.
Nos últimos 20 anos, a psicologia social juntou provas, demonstrando algo fácil de intuir: a pobreza causa danos duradouros no desenvolvimento infantil. Entretanto, um estudo publicado em 2010 abriu caminho à “neurobiologia da miséria”, como lhe chamaram os investigadores que então puseram a nu as repercussões cerebrais que as carências graves durante a primeira infância podem produzir.
Os dois novos estudos vêm juntar- se aos dados já existentes, e vão mais longe. Um deles mostra que o processamento auditivo nas crianças de meios carenciados também é mais pobre, o que acaba por repercutir- se no desempenho linguístico e cognitivo, já que estas crianças possuem uma linguagem mais pobre e uma concentração mais frágil e errática.
Para chegar a este resultado, publicado hoje no Journal of Neuroscience, a equipa coordenada por Nina Kraus, da Northwestern University, nos Estados Unidos, avaliou a resposta auditiva de grupos de adolescentes de diferentes meios sociais – carenciados e não carenciados – a estímulos auditivos e verificou que nos adolescentes de meios carenciados, há maior ruído na atividade neuronal. Isso significa na prática que “a resposta se torna mais variável e lenta, o que limita o nível de informação sensorial recebida e emitida”, explicam os investigadores, sublinhando que “na sala de aula isso pode constituir uma dificuldade”.
Já o estudo de Joan Luby, da Universidade de Washington, confirmando as consequências negativas no cérebro infantil de um ambiente carenciado – nomeadamente um hipocampo mais pequeno, e numa maior tendência para a depressão e mais dificuldades para lidar com o stress – traz também uma boa notícia. A de que os pais podem minimizar esses efeitos, construindo em casa um ambiente mais rico do ponto de vista dos estímulos: auditivos, linguísticos mas também emocional.