Número de pessoas que pedem refeições cresceu 20 a 30% no Centro de Apoio aos Sem-Abrigo

A carrinha sai às 22.00 da sede e chega à baixa do Porto após duas ou três paragens e mais de uma hora depois. Mesmo assim, além dos “ habituais” sem-abrigo que recorrem à ajuda da Legião da Boa Vontade ( LBV), há outras pessoas e até famílias que ficam à espera para conseguirem uma sopa quente e umas peças de fruta ou iogurtes. Isabel Teixeira, técnica da Legião, tem reparado nesta “ novidade”, que se verifica também em Lisboa, realça a colega Heloísa Teixeira.
É que apesar da população sem-abrigo ser mais ou menos estável – “ não notamos nenhum aumento ou diminuição, apenas a flutuação normal” – a quantidade de pessoas a recorrer às carrinhas que fazem a distribuição nocturna de refeições aumentou. No Porto, a LBV distribui entre 70 a 115 refeições por noite ( duas vezes por semana), em Lisboa cerca de 120 ( três noites). “ Acredito que outras instituições, que começam a distribuição mais cedo sintam ainda mais este aumento”, salienta Heloísa Teixeira.
É o caso do Centro de Apoio aos Sem-Abrigo ( CASA). Aqui, o número de pessoas que pedem refeições “ aumentou à volta dos 20 a 30%” desde 2008, segundo o vicepresidente Nuno Jardim. Isto, apesar de não ter havido aumento dos “ tradicionais sem-abrigo, que dormem na rua” – uma contabilidade que se faz a olho, dado que não existem dados fiáveis sobre quantas pessoas dormem na rua ou não têm residência certa.
A Assistência Médica internacional ( AMI), por exemplo, contactou com 1821 sem-abrigo no ano passado, mais 13% que em 2009. Mas no total ajudou 12 383 pessoas em situação de pobreza, o que representa um aumento de 32% face ao ano anterior.
O perfil destes novos carenciados difere do dos sem-abrigo “ tradicionais – homens entre os 40 e os 50, com poucas ou nenhumas habilitações literárias e histórico de dependências ( ver caixa). São sobretudo pessoas sem ocupação, ou que vão vivendo de biscates mal pagos, reformados com pensões muito baixas, ou famílias com ordenados que não chegam para todas as contas, explica Isabel Teixeira. “ A exposição na via pública é tão grande que para as pessoas chegarem a este ponto têm de precisar mesmo. E têm de ter estômago.” Por isso, a técnica tenta encaminhar estes casos para outro projecto da LBV: a distribuição de cabazes alimentares, que existe de 1993.
Também o presidente da Cais, Henrique Pinto, admite que a classe média é “ a que mais tem sofrido”. “ Aqueles que já viviam na rua, agora têm uma sopa a menos. Quem perdeu o trabalho, tem filhos, uma casa para pagar, não consegue viver”.