Já há mais de 400 mil pessoas a ganhar o salário mínimo

Apesar da crise que continua a assolar o mercado de trabalho doméstico – a taxa de desemprego dá alguns sinais de alívio, mas continua a registar-se uma forte destruição de emprego –, os salários mais baixos têm vindo a reforçar presença no mercado de trabalho.
O Inquérito aos Ganhos e à Duração do Trabalho, da responsabilidade do Ministério da Economia, indicava que em abril de 2011, quando o Governo assinou o memorando de entendimento com a troika, cerca de 10,9% dos trabalhadores por conta de outrem (TCO) a tempo completo ganhava o salário mínimo: cerca de 391 mil pessoas, assumindo como base o universo dos TCO do segundo trimestre de 2011 apurado pelo Instituto Nacional de Estatística. No final de 2012, o peso do salário mínimo tinha subido para 12,9% dos empregados dependentes – cerca de 418 mil.
Esta proporção ter-se-á mantido ou até aumentado ligeiramente ao longo de 2013, o que colocará o universo de pessoas que ganham o mínimo perto dos 420 mil casos. Ou seja, desde que chegou a troika, há mais 29 mil empregados com a remuneração mínima.
A tendência é similar nos ordenados abaixo do mínimo. Segundo o Inquérito ao Emprego do INE, o único escalão salarial que registou uma melhoria no emprego foi o dos rendimentos abaixo de 310 euros líquidos: mais 8% (ou 12 mil empregados) entre o segundo trimestre de 2011 e o terceiro deste ano.
Este período foi marcado pela destruição de 311 mil empregos, mostram as estatísticas oficiais. O programa de ajustamento e de financiamento termina formalmente no final do segundo trimestre de 2014.
O salário mínimo está congelado em 485 euros desde 2011, inclusive. O memorando da troika diz explicitamente que novos aumentos só podem ser “justificados por desenvolvimentos económicos e do mercado de trabalho e de acordo com o enquadramento das avaliações do programa”.
Ou seja, só quando a economia estiver a crescer de forma consistente, o desemprego a cair e terminar o longo ciclo de destruição de emprego.
Enquanto isso, Portugal vai mal em termos internacionais (ver gráfico). O salário mínimo (diluindo por 12 meses os subsídios de férias e de Natal) está em 567 euros mensais. Os gregos, apesar do ajustamento brutal, ainda ganham mais 118 euros (687 euros); na Irlanda, o salário mínimo é 2,5 vezes maior (1462 euros).
Para a troika não se justifica uma subida do SMN; para o Governo e os partidos da coligação (PSD e CDS) também não.
O primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, atira a negociação a favor de uma eventual subida para o ano que vem: “2014 é o ano em que devemos aprofundar o esforço de concertação social”.
Patrões e sindicatos vêem margem para subir
Voltou a existir sintonia entre representantes dos empresários e dos trabalhadores a favor do aumento do salário mínimo no âmbito de acordo na concertação.
Em entrevista ao Dinheiro Vivo, João Vieira Lopes, da CCP (confederação dos serviços, que tem assento na concertação)revelou que “em relação aos sectores de mão-de-obra intensiva, como as áreas de limpezas, segurança, transportes, ‘contact centers’ e afins, aquilo que nos foi dito pela maioria das empresas foi que, desde que esse salário mínimo entre em vigor universalmente e seja negociado com antecedência, não tem problema”.
António Saraiva, da CIP (indústria), diz estar disponível “para discutir” o assunto “em determinadas condições para, durante 2014, poder aplicá-lo”.
Os dois sindicatos da concertação ¬ – UGT e CGTP – defendem, naturalmente, uma subida o quanto antes.
Bruno Bobone, da Câmara de Comércio e Indústria, diz mesmo que “aumentar o salário mínimo é uma resposta inteligente dos empresários. Cria negócio porque cria mercado, faz circular o dinheiro, mobiliza as empresas, mesmo que implique, numa primeira fase, algum sacrifício”.
O debate já chegou ao Parlamento, com o BE a propor uma subida para 545 euros em 2014. A proposta teve o apoio da CDU e do PS, mas foi chumbada por PSD e CDS. A oposição diz que o Governo está isolado.
Para o Executivo, é a troika que não deixa. “É uma matéria que está no acordo do memorando de entendimento como sendo algo que está condicionado a uma apreciação dos credores de Portugal”, disse Octávio Oliveira, secretário de Estado do Emprego.