Há 140 447 famílias que já não pagam o empréstimo da casa

Quase seis em cada 100 famílias já não conseguem pagar o empréstimo da casa. Os dados ontem divulgados pelo Banco de Portugal mostram que em apenas três meses ( entre Junho e Setembro) o número de particulares com crédito vencido na habitação subiu 4557. Ao todo são já 140 447 os que estão nesta situação. A análise dos vários segmentos de crédito revela um panorama ainda mais dramático: no total contam- se já 668 874 pessoas em incumprimento.
O número de famílias com empréstimo à habitação desceu ligeiramente entre Junho e Setembro ( são menos 6753), mas o caso dos que deixaram de pagar o empréstimo seguiu a tendência inversa. Segundo os dados da Central de Responsabilidades de Crédito do BDP, há já 140 447 famílias em incumprimento, contra as 135 891 registadas no trimestre anterior e as 132 320 reportadas exactamente um ano antes.
Estes dados reflectem sobretudo a subida do desemprego e a perda de rendimentos, já que o crédito à habitação é aquele que as famílias, por norma, só deixam de pagar em última instância. Actualmente há 2,46 milhões de particulares com empréstimo de casa, que no seu conjunto devem aos bancos 113,76 mil milhões de euros. Deste total, 2,09 mil milhões estão classificados como sendo de cobrança duvidosa, o que reflecte um agravamento de 7,57% face a Setembro de 2010.
O panorama geral do crédito mostra, contudo, uma situação ainda mais grave e um forte agravamento do incumprimento no que se destina a financiar bens de consumo e outros fins. Em Setembro, 16,2% das famílias tinha prestações dos empréstimos ao consumo e outros fins em atraso. Ou seja, dos 3,79 milhões com este tipo de empréstimos ( e muitos acumulam com outro à habitação), 615 188 deixaram de pagar. Um número que revela um aumento de 10 680 casos face ao trimestre anterior e uma subida homóloga de 36 796 situações.
Tal como sucedeu na habitação, também no consumo e outros fins se registou uma subida do valor do malparado, que num ano passou de 2216 milhões de euros para 2471 milhões. Na prática, isto significa que apesar deste tipo de empréstimos representarem menos de 20% do total do crédito às famílias, o volume do incumprimento consegue, ainda assim, superar o da habitação, mostrando também por esta via que as famílias só em último caso deixam de pagar a prestação da casa.
Os números totais dos empréstimos e do crédito vencido observados em Setembro colocam no primeiro caso 4,61 milhões de pessoas e no segundo 668 874. Três meses antes, contavam- se 4,62 milhões e 660 758 casos, respectivamente.
Apesar deste panorama e deste comportamento, o ritmo de empréstimos para compra de casa registou em Setembro uma forte travagem. Naquele mês, os bancos emprestaram 281 milhões de euros para este fim, o que representa o valor mais baixo dos últimos anos – e menos de metade do que o valor concedido em Janeiro.
Em contrapartida, no mesmo mês, os particulares pediram e os bancos disponibilizaram 223 milhões de euros em crédito para consumo.

“O imobiliário tem de passar pelo arrendamento e não pela aquisição”
HABITAÇÃO O Estudo da CGD em parceria com Augusto Mateus revela que os preços da habitação mantêm- se estáveis há dez anos
Depois de vários anos de recurso à banca para comprar casa, Augusto Mateus não tem dúvidas: “O imobiliário tem de passar pelo arrendamento e não pela aquisição”, adiantou em exclusivo ao DN/ Dinheiro Vivo.
O economista e autor do estudo “A actualidade do sector imobiliário residencial: ajustamento e desafios”, realizado em parceria com a Caixa Geral de Depósitos ( CGD), afirma ter de haver “uma alteração de paradigma do mercado que passa pela reabilitação física dos edifícios e a regeneração urbana”.
De acordo com um estudo que será apresentado hoje, Portugal e Alemanha são os países onde os preços das casas menos oscilaram nos últimos dez anos, mesmo perante a situação de crise que o sector imobiliário atravessa.
“A ausência de bolha especulativa no sector imobiliário português e alemão é sugerida pela evolução dos preços na década anterior à crise”, adianta o estudo.
As perspectivas apontam para que os preços no imobiliário possam ser pressionados pela procura. “Portugal não foi afectado pelo excesso de oferta imobiliária em contexto de correcção de bolha especulativa, factor que pressiona actualmente em baixa os preços nos mercados espanhol e irlandês. No mercado nacional, é a quebra da procura que pode concretizar o risco de baixa dos preços da habitação”, explica o documento.

Cinco opções para quem já não consegue pagar a casa
ESTUDO Com o aumento do crédito malparado, a CGD divulgou várias opções para quem está em situação de incumprimento
O crédito malparado nas famílias voltou a atingir máximos históricos. No caso do crédito à habitação registou- se, em termos homólogos, uma subida de 7,56%.
Com as famílias cada vez mais em dificuldades para fazer face às suas dívidas, incluindo o pagamento da prestação do crédito à habitação, há já algumas instituições financeiras que apresentam soluções para estes casos.
No estudo “A actualidade do sector Imobiliário Residencial – Ajustamentos e desafios”, realizado pela Augusto Mateus e Associados em parceria com a Caixa Geral de Depósitos ( CGD), são apresentados cinco instrumentos para gestão do incumprimento.
A primeira sugestão é o alargamento dos prazos das operações ( até 61 anos de maturidade e 80 de idade). Este é “utilizado quando o cliente não demonstra capacidade para pagar o valor das prestações, mas tem capacidade para depositar outro valor mais reduzido, permitindo, geralmente, uma redução significativa do encargo mensal”.
O período de carência de capital ( até 12 meses) pode ser outra alternativa, conjugando- se, ou não, com outras opções. “Gere, sobretudo, reduções significativas de rendimentos dos clientes por motivos transitórios ( como situações de desemprego ou doença a inverter no curto/ médio prazo), assegurando- se apenas o pagamento dos juros”.
Outra das opções é o diferimento de parte do capital ( até 30% para o final do prazo), “quase sempre utilizado em conjugação com outras alterações, e quando se perspectiva, a prazo, um aumento gradual dos rendimentos auferidos pelo cliente”.
A alteração da data de cobrança da prestação para o melhor momento de crédito de fundos ( vencimentos, rendas, pensões, etc.), assegurando a existência de saldo em conta para pagamento do crédito à habitação é um das opções referidas no estudo.
Por fim, há ainda a possibilidade de optar pelo Fundo de Investimento Imobiliário para Arrendamento Habitacional ( FIIAH). Este “envolve a substituição do contrato de crédito à habitação própria permanente por um contrato de arrendamento, sempre que a mesma permita reduzir substancialmente os encargos com a habitação e nela permanecer com direito a opção de compra”. Segundo o estudo, esta “solução é adoptada quando o encargo com a renda se afigura mais consentâneo com a capacidade do cliente, tendo- se em consideração na comparação não apenas o valor prestacional, mas também o desaparecimento dos encargos inerentes à condição de proprietário ( por exemplo: seguros, obrigações fiscais, despesas de condomínio, manutenção, etc).

Portugueses são os que têm créditos mais longos
Se por um lado há uns anos o financiamento para compra de casa era feito por prazos até 20 ou 25 anos, agora as maturidades são de 30, 40 ou até mais anos. Em 2007, Portugal liderava a quota de prazos acima de 40 anos na Europa, revela o estudo “A actualidade do sector imobiliário residencial: Ajustamentos e desafios”, realizado pela Augusto Mateus e Associados em parceria com a Caixa Geral de Depósitos ( CGD).
O estudo, que é hoje apresentado, adianta ainda que “por cada dez empréstimos concedidos em 2007, cerca de oito na Irlanda, de sete em Portugal e na Holanda e de seis em Espanha tinham maturidades acima de 30 anos, confirmando a negociação de maturidades mais longas nos países com famílias mais endividadas”.
No que diz respeito ao rácio LTV – o rácio típico entre o montante de financiamento e o valor da garantia ( geralmente a avaliação do imóvel) – Portugal está bem posicionado ( 71%), abaixo da média da área do euro e em linha com a Alemanha, o que contrasta com a prática de rácios elevados do Norte, como a Holanda ( 101%), a França ( 91%), ou a Irlanda ( 83%), mais vulneráveis à desvalorização dos preços das casas.
Além disso, o estudo mostra que Portugal apresenta a “segunda maior quota de j uventude: a distribuição etária dos empréstimos concedidos em 2007 mostra que cerca de dois terços ( 2/ 3) dos mutuários tinham menos de 40 anos”.