Desemprego e crise levam mais gente aos balneários

Os duches nos velhinhos balneários públicos de Lisboa, onde não se paga nem a água ou o sabão, estão a seduzir mais famílias devido à crise e ao desemprego. Em Alcântara, por exemplo, há mais de 10 mil peças de roupa para dar a quem mais precisa.

Em Setembro, a média mensal de duches no balneário de Alcântara não chegava aos mil banhos. No mês seguinte, já se aproximava dos 1500 banhos e os gastos com o sabão duplicaram, garantiu ao JN Vítor Palmilha, da Junta de Freguesia de Alcântara. A subida mantém-se desde então.

O balneário é um dos mais antigos da cidade e o que regista mais duches. Nos restantes, o número de utilizadores não tem subido de forma tão vertiginosa e é sobretudo frequentado por moradores do bairro. Em Alcântara, chega gente de toda a cidade, da outra banda, e muitos sem-abrigo, atraídos, talvez, pelas mais de 10 mil peças de roupa para oferecer e pela lavandaria social gratuita.

Foi em 2005 que começaram a guardar roupa no balneário de Alcântara e, desde então, sucedem-se as ofertas. "Devido à crise, as pessoas estão ainda mais solidárias e nós temos muita pobreza envergonhada na freguesia. As pessoas tomam banho e vestem roupa lavada. Há quem precise de uma roupa melhor para ir a uma entrevista de emprego e pode vir aqui buscar", explica Vítor Palmilha, acrescentando que está a ser ponderada a criação de um gabinete de inclusão para o emprego na Quinta do Cabrinha.

"Olhe, eu trago aqui mais uma sacada de roupa de homem. Estou sempre a dizer aos meus vizinhos para não deitarem nada fora. Se quiserem, eu mesma trago para o balneário", diz Assunção Quitano, que se cruza no caminho com Maria Adelaide, que traz roupa por estrear de uma irmã que faleceu recentemente. Em tempos, também Adelaide tomou ali banho, quando eram poucas as habitações com casa-de-banho.
 
José Francisco é sem-abrigo e dorme na Gare do Oriente. Mas é no balneário de Alcântara que passa o dia. Toma banho, veste roupa lavada e faz ali os curativos às mãos e aos pés, que não têm dedos e estão em carne viva. É Vítor Peito, o funcionário do balneário que faz as vezes de enfermeiro.

Na Serafina, a roupa é lavada a custos simbólicos – os preços variam entre 1,5 e três euros -, mas os banhos continuam a ser de borla. Francisco Amadeu, um dos utilizadores, não tem pudor em revelar que usa o balneário para poupar na água e no gás. Já Rosária Cachimbel garante que só o faz quando o esquentador avaria.

A maioria dos balneários encontra-se, porém, bastante degradada, afastando muita gente. Nunes da Silva, responsável pelas Infra-estruturas e Obras na Câmara de Lisboa promete uma intervenção generalizada este ano, nos edifícios e na substituição das caldeiras a gasóleo por painéis solares.

Em Alcântara, as obras vão estender-se à substituição da cobertura. No de Santa Engrácia, o presidente da Junta estima gastos na ordem dos 200 mil euros. "Gostaríamos de reformular todo o edifício e reservar todo o piso para um espaço mais voltado para a cultura", avança Joaquim Pires.

Na Ajuda, o Comité Olímpico de Portugal, que tem sede na freguesia, mostrou interesse em instalar um tribunal arbitral para o desporto no edifício do actual balneário. José Videira, presidente da Junta da Ajuda não se opõe à ideia, desde que seja construído um novo balneário que possa incluir uma valência de lavandaria.