Temos dos idosos mais pobres da UE

Há idosos portugueses que morrem sozinhos. AugustaMartinho foi encontrada há duas semanas em casa, em estado de decomposição, após oito anos de desaparecimento. Há idosos abandonados em hospitais, em lares. Idosos que deixaram para trás umavida, esquecida por todos. Uma vida que, comparada com a dos outros idosos da União Europeia, é cada vez mais difícil de ser vivida.

Dados recolhidos pelo DN revelam que os idosos portugueses têm menos condições para viver a sua velhice com qualidade do que os do resto da UE. Apesar de viverem o mesmo tempo, têm menos dinheiro e menos anos de vida saudável. O rendimento médio de uma família portuguesa em que um dos elementos tem mais de 65 anos é quase metade da média europeia – 790 euros por pessoa em Portugal, para cerca de 1450 na média da UE – e as pensões são em muitos casos baixas, apenas de sobrevivência.

Em comparação, o rendimento médio de uma família espanhola passa os mil euros e no Luxemburgo chega aos três mil. Pelo contrário, atrás de Portugal ficam nove países do Leste europeu – a Bulgária é o pior com 186 euros por mês. A agravar a situação, lembra a demógrafa Filomena Mendes, está o facto de “ haver muitos idosos, sobretudo mulheres, que nunca descontaram para aSegurança Social e ganham pensões de sobrevivência”, muito baixas. “ É um grupo muito vulnerável à pobreza”. Portugal tem reformas baixas e “ os idosos dependem muito das pensões”. Asituação é agravada porque temos mais mulheres pensionistas do que homens, que ganham menos e depois têm pensões mais baixas.

Não surpreende por isso que um terço dos idosos sozinhos esteja abaixo do limiar de risco de pobreza – ou seja, tenham um rendimento igual ou inferior a 60 % da média nacional. O valor é significativamente inferior para os casais: 18, 7%. Em ambos os casos, no entanto, está acima da média europeia. Ao facto de uma grande fatia dos nossos idosos terem poucos recursos económicos junta-se ainda a pouca saúde para gozar os últimos anos de vida. Aos 65 anos, um português pode esperar viver quase mais 17 e umamulher ainda mais, até aos 85. Mas apenas mais seis ou cinco destes anos serão vividos com saúde e sem limitações físicas – um dos valores mais baixos em toda a UE, só superado por alguns países do Leste europeu.

Com mais de 85 milhões de idosos a viver nos 27 países da UE a Europa tornou-se literalmente oVelho Continente, com seis dos sete países mais envelhecidos do mundo. Mas as condições em que os idosos vivem variam muito. Quanto à expectativa de vida saudável ao entrar na idade de reforma, a média europeia é de 8,7 anos para os homens e de 6,8 para as mulheres, mas hápaíses como o Reino Unido e Espanha em que os cidadãos podem esperar viver mais uma década depois dos 65 sem qualquer limitação física. Por outro lado, em países do Leste, como a Eslováquia, este valor não chega aos três anos.

Reflexo das condições de vida e do sistema de saúde, este valor resulta também dapercepção que cada povo tem da sua saúde, diz Filomena Mendes. Isso explica porque é que as mulheres, que têm umaesperança de vida maior, têm depois menos anos de vida saudável. “ As mulheres dão mais atenção à saúde, vão mais ao médico e descobrem os problemas antes. Além disso, queixam-se mais.” Razões que fazem com que acabem por viver mais. E, como vivem mais, a percentagem de idosas a viverem sozinhas é também muito maior. Em 2006, 28,8% estavam nesta situação, contra apenas 9,4% dos homens. Mas, neste capítulo estamos longe de ser os piores da UE. Aliás, comparando a população idosa com o número de maiores de 65 a viverem sozinhos, vemos que estes são quase um terço – quando em Portugal rondam os 20%. Na Finlândia, por exemplo, são mais de 35%.

Mas como nas outras tendências demográficas, em que Portugal demonstrou ser bom aluno, é provável que o País siga os outros. “ Vamos ter mais idosos e logo mais idosos a viver sozinhos. Além disso, como filhos e família deixam de viver geograficamente perto isso faz com que mais vivam sem ninguém”, diz Filomena Mendes. Viverem sozinhos não é um problema à partida: “ Têm é de ter autonomia e independência para se bastarem a si próprios. “