Lisboa: Problemas da região submersos pela crise nacional

Fernando Nobre ainda tentou meter a colherada, já o debate televisivo de há uma semana
com o seu rival socialista Ferro Rodrigues ia a mais de meio: “Também gostaria que falássemos do distrito de Lisboa, onde há 100.000 desempregados.” Debalde. A situação do país dominou a conversa dos cabeças de lista escolhidos pelo PS e pelo PSD para o distrito, apagando do mapa os problemas da região onde está inserida a maior área metropolitana do país. Salvou-se o tema da falta de emprego,
abordada apenas e só devido ao seu carácter nacional. Os principais partidos replicaram
a estratégia: escolheram os seus principais dirigentes – ou, no caso das duas principais forças
políticas, figuras de prestígio – para encabeçarem as listas por Lisboa, relegando para segundo plano do debate eleitoral as questões locais. “Durante o debate televisivo, não houve tempo”, desculpa-se Ferro Rodrigues. “E não há nenhum problema nacional que não seja de Lisboa.”
O busílis é que o inverso não é verdadeiro. E a riqueza existente no distrito – no qual se situam seis dos 15 concelhos com maior poder de compra do país, mas também o Cadaval, o concelho mais pobre da região – tapa assimetrias nem sempre visíveis.
Os problemas sociais resultantes do empobrecimento fazem parte de um conjunto de questões que muitos consideram mais facilmente resolúveis à escala metropolitana. “Apesar do excesso de habitação, se as famílias não conseguirem manter as casas podem vir a surgir mais barracas”, avisa Fonseca Ferreira, antigo presidente da Comissão de Coordenação da Região de Lisboa e Vale do Tejo. “O acordo com a troika é péssimo, mas tudo depende da forma como os partidos o operacionalizarem.
E o emprego é uma questão fulcral”, prossegue. A situação neste momento não é famosa na cidade de Lisboa: mais de um quarto da população é constituído por reformados, beneficiários
do rendimento mínimo e desempregados. A criação de um governo metropolitano, que permitisse definir políticas transversais em áreas como os transportes públicos, a habitação e eventualmente o apoio social é, para o vice-presidente da Câmara de Lisboa, Manuel Salgado, imperiosa. Seria directamente eleito pelos habitantes e não substituiria os municípios. “Há questões que cada uma das autarquias não está em condições de resolver sozinha”, concorda o presidente da Junta Metropolitana de Lisboa, Carlos Humberto. “E a região de Lisboa não tem uma voz que a represente, o que é mau.” A degradação dos centros históricos, à espera de uma reabilitação em grande escala, é outra questão premente. Manuel Salgado pensa que a crise pode funcionar como uma oportunidade para parte da população abandonar os subúrbios e voltar a habitar o centro das cidades, que, apesar de ter casas mais pequenas, fica habitualmente mais próximo dos locais de emprego. De facto, nem tudo serão consequências negativas: embora de forma ainda muito incipiente, parece estar a resultar das primeiras medidas de austeridade um aumento da utilização dos transportes públicos, com a consequente redução de automóveis nos centros urbanos.