Portugal está (um pouco) menos desigual, mas ainda nem recuperou da crise

Diminuição das desigualdades nos últimos dois ou três anos pode não ser sustentável porque muitos novos empregos são precários e mal pagos.
No dinheiro no banco ou na carteira, mas também na saúde, na educação, na cultura e até na participação política. Portugal continua a ser um dos países mais desiguais da Europa, numa distância que tem melhorado um pouco nos últimos dois ou três anos mas que ainda não chegou para compensar o ‘fosso’ que se cavou, ainda mais, durante os anos da crise e da troika, mas também de décadas de desigualdades estruturais.
O diagnóstico às várias formas de desigualdade entre os portugueses é feito no livro “Desigualdades Sociais: Portugal e a Europa”, a ser apresentado na próxima quarta-feira em Lisboa num colóquio que assinala os 10 anos do Observatório das Desigualdades do Instituto Universitário de Lisboa – ISCTE.

Renato Carmo, o coordenador do livro que conta com a participação de dezenas de investigadores, explica que o problema da desigualdade é algo estrutural e persistente na sociedade portuguesa, não se invertendo em poucos anos, “mantendo-se ao longo das gerações”.
Os vários capítulos mostram que Portugal continua a ser um dos países mais desiguais da Europa, mas vai além do diagnóstico habitual, apenas monetário, olhando, também, para outros tipos de desigualdades.
As enormes diferenças entre ricos e pobres voltam a ser destacadas, mas também na participação cultural há diferenças claras entre portugueses: aqueles que têm mais formação escolar são quase sempre os que têm práticas culturais mais frequentes. Na política, aqueles que participam são também, quase sempre, os mais escolarizados.

“Uma base pauperizada”

No dinheiro que temos ou não no banco, o livro também revela que os portugueses pobres são dos mais pobres da União Europeia: “A base é bastante pauperizada”.
Ou seja, além de uma elevada taxa de risco de pobreza, ao nível dos países de Leste, os pobres em Portugal têm rendimentos de facto muito baixos o que aponta para casos de pobreza “não apenas relativa mas também absoluta”.

Os 20% mais pobres em Portugal ganham menos de 428 euros, o nono valor mais baixo da União Europeia: “A realidade portuguesa é mais positiva do que nos países do Báltico, dos Balcãs e do Leste Europeu, mas bastante distanciada dos países da Europa Central e do Norte”.

O limiar para ser pobre em Portugal é baixo e, na prática, aqueles que em muitos países europeus são considerados pobres em Portugal não o seriam, mesmo quando se tem em conta o custo de vida em cada país.
Apesar da recuperação do emprego e dos sinais positivos nas desigualdades em Portugal nos últimos dois ou três anos, os estudos feitos pelo Observatório das Desigualdades também revelam que os novos empregos são essencialmente precários e mal pagos, com o exemplo claro do que se passa no turismo, havendo dúvidas se os avanços positivos que se sentem são ou não sustentáveis a longo prazo.