Mais desiguais, piores alunos

Quanto mais habilitações tem a mãe, melhores os resultados dos filhos na escola. O nível socioeconómico também joga um papel importante, diz um estudo do Ministério

segunda vez – primeiro para o terceiro ciclo, no ano passado, e agora para o segundo – que o Ministério da Educação, através da Direção-geral de Estatísticas, analisa os resultados em função de algumas características das famílias portuguesas, no estudo “Desigualdades Socioeconómicas e Resultados Escolares”. E as tendências mantêm-se: uma relação muito forte entre o desempenho e o contexto socio-económico dos alunos, a somar a assimetrias regionais.

Mas o estudo revela também que a dinâmica das escolas pode subverter este cenário, o que liberta os dados de interpretações deterministas que levem a concluir, por exemplo, que nem as habilitações literárias permitem mobilidade social.

Os escalões do Apoio Social Escolar (ASE) confirmam as dificuldades escolares associadas às financeiras. “Entre os alunos que não recebem qualquer apoio ASE, a percentagem de percursos de sucesso no 2.º ciclo é de 63%. Entre os alunos com maior apoio ASE (escalão A), alunos oriundos de agregados familiares com condições económicas mais modestas, a mesma percentagem de percursos de sucesso é apenas de 27 por cento”. No grupo de estudantes sem apoio financeiro, 92% transitam de ano. Já as famílias com o maior apoio do ASE, a taxa de sucesso escolar não vai além dos 78 por cento.

A investigação agora publicada revela ainda que nos casos em que as mães têm licenciatura ou bacharelato, a percentagem de percursos de sucesso é de 80 por cento. Pelo contrário, os alunos com mães que não foram além do 4.º ano atingem bons resultados em apenas 26% dos casos.

Quanto mais letrados os encarregados de educação, melhor a prestação escolar dos filhos, confirmando-se igualmente a importância dos rendimentos familiares: “Alunos provenientes de meios socioeconómicos favorecidos tendem a obter, em média, melhores resultados escolares do que os seus colegas oriundos de meios mais desfavorecidos”.

Esta conclusão é especialmente preocupante na medida em que põe em causa a própria génese do sistema público – e universal – de educação que se pretende em Portugal. Nivelamento de oportunidades e promoção da mobilidade social ficam, assim, longe de garantidas.

Mas a análise estatística regional forneceu dados curiosos, que obrigam a olhar para o estudo com mais pormenor. Embora Setúbal tenha mães mais diferenciadas do que os outros distritos, o resultado académico dos filhos não é coerente. Com 43% de sucesso escolar, Setúbal é o pior distrito do País, por oposição a Coimbra (60%), com a melhor prestação. “Em média, os alunos do distrito de Braga cujas mães têm habilitação baixa, equivalente ao 6.º ano, têm um desempenho escolar no 2.º ciclo superior aos alunos do distrito de Setúbal cujas mães têm como habilitação o 12.º ano completo. Existem, portanto, outros fatores importantes em jogo, além do nível socioeconómico.”

Se o percurso académico e os rendimentos dos pais jogam um papel importante, as condicionantes regionais parecem um dado a ter cada vez mais em conta. “Os alunos dos distritos do sul do país têm níveis de habilitação das mães acima da média de Portugal continental, mas resultados escolares significativamente abaixo da média. Observe-se em particular como os alunos dos distritos de Faro, Lisboa ou Setúbal, tendo níveis de habilitação das mães francamente superiores aos dos seus colegas de Viseu, Braga ou Aveiro, têm ainda assim taxas de percursos de sucesso bastante inferiores – cerca de 12 pontos percentuais mais baixas – do que estes seus colegas do norte do país”.

Os autores do estudo alertam, por isso, para a necessidade de cruzar variáveis. “O nível socioeconómico não equivale a destino, ou seja, não determina de forma inapelável o desempenho escolar dos alunos. Prova disso é o facto de os alunos de certas regiões do país com indicadores socioeconómicos desfavoráveis, como Braga ou Viseu, terem, não obstante, indicadores de desempenho no 2.º ciclo francamente superiores à média nacional.”

Além do nível socioeconómico e das habilitações dos encarregados de educação, alertam os autores do estudo, “o dinamismo das escolas e dos professores”, bem como a importância atribuída à escola em cada região podem fazer a diferença.

Embora o sistema seja o mesmo, as variações entre escolas são ainda assinaláveis, o que aponta para a necessidade de atuar em cada universo.