Em 2060, Lisboa vai ter tantos habitantes como a região norte

Capital vai precisar de bastante mão-de-obra imigrante, situação “preocupante” segundo o investigador Jorge Malheiros. Incentivos à natalidade precisam de ser reforçados

A região norte será a que vai perder mais população até 2060 e Lisboa a que perderá menos. Conclusão: dentro de 43 anos, os residentes na área metropolitana da capital serão quase tantos como os habitantes da região norte, que tem uma superfície sete vezes maior. Mas como toda a economia está concentrada no litoral, é Lisboa que vai precisar de mais mão-de-obra imigrante. E isto é “preocupante”, dizem os investigadores sociais.

“O mais preocupante é manter-se uma tendência estrutural para que os desequilíbrios demográficos continuem a decorrer. Não havendo migração de substituição, todas as regiões vão perder população, mesmo o litoral. As necessidades, quer em termos demográficos quer da necessidade dos recursos humanos para a economia, são maiores em Lisboa, norte e centro litorais, o que significa que vão manter-se os desequilíbrios”, sublinha Jorge Malheiros, um dos organizadores do estudo “Migrações e sustentabilidade demográfica”, da Fundação Manuel dos Santos.

Concluem os investigadores que são precisos 75 mil imigrantes por ano para satisfazer as necessidades de mão-de-obra de Portugal em 2060, com algumas diferenças regionais. E, nas últimas décadas, toda a economia se tem concentrado em redor da capital portuguesa. “Esta concentração faz que nem com os migrantes de substituição corrijam os desequilíbrios demográficos”, sublinha o geógrafo.
Atualmente, Portugal terá dez milhões de habitantes que passarão a 7,8 milhões se se mantiverem as condições atuais: poucos nascimentos, embora a taxa esteja a subir ligeiramente; e muitas mortes. Nasceram 87 440 crianças em Portugal no ano passado, mais 1661 do que em 2015, e, com exceção das ilhas, todas as regiões registaram melhorias. Apenas a AML teve um saldo demográfico positivo, pequeno, mas positivo: 0,01%. É também quem tem o índice de fecundidade mais elevado, 1,66 filhos por mulher em idade fértil, segue-se o Algarve (1,61). Jorge Malheiros não tem dúvidas em afirmar que para essa evolução contribuíram os saldos migratórios, residentes que circulam no país e, sobretudo, que chegam do estrangeiro.

A manter-se a situação atual, a população ativa de 4,3 milhões (em 2015) reduzirá para 2,8 milhões em 2060, com todas as implicações negativas para a sustentabilidade da Segurança Social. A taxa de desemprego abastecerá os setores económicos no imediato, mas deixará de o fazer dentro de quatro anos. E Lisboa vai precisar de 723 mil trabalhadores. Se juntarmos todo o litoral, incluindo o norte e o centro, serão necessários mais 1,7 milhões de pessoas para as necessidades laborais. E os concelhos com menor densidade populacional veem agravar-se ainda mais a situação.

É o caso de Alcoutim, cujo presidente tem tentado inverter a situação de despovoamento, nomeadamente com incentivos à natalidade em géneros, cujo programa foi lançado no último trimestre de 2014. Em 2015, mais que duplicaram os nascimentos – de seis (2013) para 15 (em 2015). O ano passado houve nova quebra, nasceram nove crianças. Osvaldo Gonçalves entende a redução como correspondendo a um “ciclo normal” e não como um falhanço da medida. Pensa, até, em melhorá-la e prepara um regulamento para os jovens adquirirem casa no concelho. Reconhece, no entanto, que não chega para inverter a tendência neste concelho algarvio.

“A desertificação do interior atingiu uma situação tão grave que, primeiro, temos de estabilizar a população, o que não se prevê ser fácil. Ficamos muito contentes por nascerem mais quatro ou cinco crianças num ano, mas a verdade é que assistimos a funerais todas as semanas. Tem de haver fortes incentivos de combate ao envelhecimento demográfico, são precisas medidas governamentais de fundo. Devem ser criados a nível nacional apoios à natalidade e que vão aumentando consoante o número de filhos, para garantir que uma mãe possa estar com a criança até um ano, 18 meses. Mas esses incentivos não deverão ser em dinheiro. Por exemplo, podem ser atribuídas ajudas ao pagamento da renda de casa ou da luz e da água”, defende Osvaldo Gonçalves.

Jorge Malheiros propõe medidas nacionais a nível económico, na organização dos serviços públicos e estímulos ao investimento. “Conseguir apoio público para captar investimento para determinadas áreas do interior, mostrando que as comunicações são boas, que há mão-de-obra disponível, explicar as vantagens de se viver nessas localidades”, são algumas das soluções que avança. E, claro, introduzir estratégias para garantir qualidade de vida de quem habita nessas regiões. “Manter os serviços públicos em vez de os encerrar, garantir que as vias de acesso são boas e, depois, incrementar o emprego qualificado para atrair pessoas para essas zonas.” Mas, alerta: “Mesmo que tudo isso seja feito, não vamos mudar a estrutura do país, podemos atenuar os desequilíbrios, mas não os vamos inverter.” Daí a necessidade que Portugal tem de que muitos mais estrangeiros decidam vir viver para o país, aumentando o fluxo que se tem registado nos últimos anos.